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domingo, 11 de maio de 2014

Estudo mostra mapa mais detalhado do início do Universo

Mapa exibe os primeiros sinais de luz do Universo

Emitidos 380.000 anos depois do Big Bang, uma espécie de "fóssil" que pode ajudar a explicar a formação de estrelas e planetas

Guilherme Rosa
mapa
O mapa mostra o que seria o Universo "apenas" 380.000 após o Big Bang: os pontos azuis mostram as regiões mais densas, que acabaram dando origem às galáxias (ESA and the Planck Collaboration)
Pesquisadores da Agência Espacial Europeia (ESA, na sigla em inglês) divulgaram nesta quinta-feira um mapa que mostra os primeiros sinais de luz do Universo, emitidos "apenas" 380.000 anos depois do Big Bang. Segundo os cientistas, esses raios são uma espécie de fóssil que pode ajudar a explicar a
formação e evolução das galáxias, estrelas e planetas — incluindo a Terra. "Ousamos observar o Big Bang de muito perto, o que permite uma compreensão da formação do Universo vinte vezes melhor do que antes", disse Jean-Jacques Dordain, diretor-geral da ESA, ao apresentar os resultados.
O mapa é feito a partir das informações coletadas durante os primeiros 15 meses de observações feitas com o telescópio espacial Planck, lançado pela ESA em 2009 para estudar a radiação cósmica de fundo — os primeiros raios de luz emitidos em toda a história. Nos primeiros momentos após o Big Bang, o Universo era composto por uma mistura muito quente de prótons, elétrons e fótons. Com o passar dos milênios, essa mistura foi se resfriando e, quando chegou a cerca de 2.700 graus Celsius, prótons e elétrons passaram a se juntar, formando os primeiros átomos de hidrogênio e hélio. Assim, os fótons, que são as partículas de luz, ficaram livres para percorrer o cosmos.
Essa mesma radiação primordial está até hoje, mais de 13 bilhões de anos depois, viajando por todo o cosmos. No entanto, com a enorme expansão que o Universo sofreu durante esse tempo, esses raios de luz também tiveram seu comprimento de onda expandido. Eles são invisíveis ao olho humano e só podem ser observados por meio de radiotelescópios ou telescópios infravermelhos — como o telescópio Planck.
Cartografia estelar — Apesar de essa radiação estar quase uniformemente distribuída pelo Universo, ela apresenta algumas flutuações muito pequenas de temperatura, que foram detectadas pelos instrumentos sensíveis do satélite. Essas flutuações representam pontos onde o Universo era mais denso (isso está representado no mapa pelas cores mais azuladas). "O mapa feito pelos pesquisadores mostra essas variações minúsculas de temperatura, que seriam o ponto de partida para o Universo que existe hoje", diz Raul Abramo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo.
Esses pontos de maior densidade, segundo os pesquisadores, seriam como sementes das estruturas que formam o Universo hoje em dia. Com o passar do tempo, esses pontos começaram a acumular matéria e, gradualmente, a força de sua gravidade foi formando estrelas e galáxias. "O mapa fornece uma fotografia extremamente detalhada do início do Universo. Todas as estruturas que vemos hoje em dia cresceram de flutuações pequenas de densidade pouco depois do Big Bang", disse Simon White, diretor do Instituto Max Planck de Astrofísica, que esteve envolvido nesse estudo.

universo
Modelo padrão — Segundo os pesquisadores, os dados apresentados no mapa estão, em geral, de acordo com o previsto pelas teorias desenvolvidas para explicar a origem e evolução do Universo, chamadas de modelo cosmológico padrão.  Além disso, eles ajudam a refinar as informações usadas nessas pesquisas. Por exemplo, o estudo estabelece um novo valor para a taxa com que o cosmos está se expandindo e uma nova idade para o Universo: 13,82 bilhões de anos — próxima da margem de erro antes estimada.

Saiba mais

MATÉRIA ESCURA
Quando os cientistas observam a forma com que estrelas e galáxias se movem, há algo inusitado. Segundo as leis da física, as estrelas e planetas deveriam se movimentar mais lentamente à medida que se afastam do centro dela. Mas isso não acontece na prática. Para que as equações da física façam sentido, é preciso que exista alguma força empurrando o amontoado de poeira, gás, estrelas e planetas da periferia das galáxias em velocidades semelhantes a de corpos que estão mais próximos do núcleo. Essa força adicional é a gravidade de uma manifestação da natureza que possui massa, mas não emite qualquer luz.
ENERGIA ESCURA
A energia escura é uma componente descoberta recentemente que representa 70% do conteúdo do Universo. Ela é a suposta responsável pela aceleração da expansão do Universo.
A análise também serve para atualizar a distribuição de material que forma o Universo. Segundo o estudo, a matéria normal, responsável pela formação de estrelas e planetas, contribui com apenas 4,9% da massa e da densidade de energia do universo. Até agora, o valor esperado era de 4,5%. A matéria escura, que é invisível e só é conhecida por causa de seu efeito gravitacional, corresponde a 26,8% da massa do Universo. Antes, era 22,7%. O resto — 68,3% — é composto pela energia escura, um componente misterioso ao qual se atribui a expansão do Universo.
Alguns dados, porém, são difíceis de explicar e conciliar com o modelo padrão. Os cientistas, por exemplo, descobriram assimetrias entre temperatura de hemisférios opostos do céu, o que vai contra a ideia prevista pelo modelo de que o Universo seria bastante similar em qualquer direção. Além disso, eles encontraram uma parte fria que se estende por uma região muito maior do que o esperado. Segundo os cientistas, esses dados terão de ser mais estudados, e, se não forem erros de medição, podem levar a uma revisão do modelo.
 

Opinião do especialista

Raul Abramo
Professor do Instituto de física da Universidade de São Paulo

"Esse mapa é muito importante, pois mostra um retrato de como era o Universo quando ele tinha apenas 380.000 anos de idade, e não existia nenhuma estrela ou molécula — nem um mísero grão de matéria. Ele constitui a observação definitiva dos primórdios do universo. Vai ser uma referência no futuro e ainda será estudado daqui a 100 ou 200 anos."
"O fato de as observações estarem de acordo com as teorias dos cientistas é uma comprovação extremamente poderosa de que os modelos que usamos para explicar a origem e a evolução do Universo estão funcionando. Isso mostra que nossas teorias sobre a gravidade e as forças fundamentais funcionam muito bem para descrever como o Universo funciona."
"O estudo encontrou algumas anomalias que não eram esperadas pelo modelo padrão. Sabemos que o Universo tem uma alta dose de aleatoriedade, de caos. Mas o Telescópio Planck confirmou que, nas maiores escalas observáveis, sua distribuição parece um pouco menos aleatória do que seria esperado. Isso, no entanto, não é novidade — já havia sido observado por outras medições. O que os pesquisadores fizeram foi confirmar que essas anomalias existiam. Mesmo com as novas medições, os pesquisadores não sabem o que essas anomalias  são — isso vai ficar em suspense. Não está claro se algum dia isso será respondido. Então, na verdade, nada muda. Frente às outras descobertas e ao conjunto de dados apresentados, a significância dessas anomalias é muito pequena."

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